Por Luís Costa Pinto
Como se surgisse do nada, em meio ao mormaço da sexta-feira 23 de abril, o médico-cardiologista Marcelo Queiroga atira a esmo a informação: o Ministério da Saúde obrigará uma instância técnica da pasta a prescrever o uso de cloroquina em coquetel de drogas que, potencialmente, poderão ser usadas por clínicos no tratamento de pacientes com Covid-19 desde que não tenham “manifestações severas” da doença. Ainda prometeu – ou ameaçou? – que fará a indicação constar na plataforma do Sistema Único de Saúde, o SUS. “Vai virar política pública”, asseverou.
Como se ninguém fosse perceber o ardil, o publicitário Fábio Wajngarten, ex-secretário de Comunicação do Palácio do Planalto, surge nas páginas da revista Veja concedendo uma entrevista esquisita – as esquisitices se espraiam também pelas perguntas que não foram feitas pelo entrevistador ao entrevistado – na qual põe toda a culpa da lentidão da vacinação contra o coronavírus no Brasil no ex-ministro e general Eduardo Pazuello e sua equipe militarizada da Saúde. Na versão edulcorada de Wajngarten, vendida à revista e certamente comprada a peso de ouro, o presidente Jair Bolsonaro não tem participação nenhuma na inépcia e na incompetência do governo federal no combate à pandemia.
Por que Wajngarten não foi perguntado sobre os tópicos que seguem:
- Ma che cazzo um secretário de Comunicação quer ao se imiscuir em temas técnicos – relativos a tratamento e combate de um vírus em meio a uma devastadora pandemia – ligando direto para executivos de um laboratório internacional como o Pfizer, marcando reuniões entre gerentes do Ministério da Saúde e um ente privado?
- Não passou pela cabeça do bom repórter de Veja perguntá-lo se não temeu ser lido como lobista em Brasília? Sim, a capital da República “lê” as pessoas.
- Wajngarten antevia algum interesse privado, para ele, como representante comercial futuro do Pfizer?
- Se Bolsonaro não tinha nada a ver com o atraso na assinatura de contratos, por que então concedeu mais de uma entrevista ou mais de um show de imprecações falando das “cláusulas draconianas” da Pfizer como motivo para o atraso incompetente na chegada de mais uma vacina ao rol de imunizantes disponíveis no País?
- Por que Wajngarten não foi perguntado sobre as campanhas publicitárias que já somam R$ 200 milhões do Ministério da Saúde em torno de campanhas de vacinação e de protocolos duvidosos de comportamento social? Ele tinha domínio total sobre as verbas do setor, responde a várias ações por má gestão de recursos da publicidade oficial junto ao Tribunal de Contas da União e foi o demandante de briefings calhordas para a comunicação oficial defender as teses bizarras de Bolsonaro em relação à pandemia.
- Quem plantou Wajngarten como entrevistado para a Veja? Aqui, vai uma suposição minha – mero faro, que o conecta a Marcelo Queiroga: foi Sérgio Etchegoyen, general de pijama, da reserva, que comandou a arapongagem do Palácio do Planalto no período nefasto de Michel Temer e abriu as portas – e as burras – do poder e dos quarteis para a ascensão de Bolsonaro.
A entrevista de Fábio Wajngarten é suspeita. Como sói acontecer com a choldra de desqualificados que ronda o bolsonarismo – e Wajngarten é só mais um deles – o tiro do cangaceiro paulistano ameaça sair pela culatra da garrucha que usaram. Deslealdade e covardia são duas fraquezas de caráter quem unem políticos e militares: ambas categorias têm ojeriza a quem lança mão desses dois defeitos para atingir seus objetivos. Açulados pelas fraquezas de Wajngarten, os militares ameaçam ficar solidários a colega de farda Pazuello, ainda general da ativa, quando ele sentar no banco dos réus da CPI do Genocídio. Basta ao ex-ministro da Saúde assumir seus erros trágicos e lembrar que obedecia a ordens do chefe, Jair Bolsonaro, na cadeia de comando que levou à morte de 385.000 brasileiros.
Recém-desembarcado em Brasília, o paraibano Marcelo Queiroga dá sinais de ter trocado o jaleco de médico pelos ternos dos causídicos de porta de cadeia. Ao impor agora, no 14º mês de pandemia e depois de estudos científicos já determinantes que apontam a cloroquina como droga inútil em quaisquer fases de tratamento de infecções por Covid-19, o que ele tenta fazer é construir um álibi para o chefe. Jair Bolsonaro, o genocida a quem Queiroga tenta alcovitar sob o manto de criação de uma “política pública” empurrada garganta abaixo do SUS, sabe que será incriminado pela CPI do Genocídio do Senado como responsável por:
- Mortes decorrentes de nebulização de cloroquina em pacientes no Amazonas e no Rio Grande do Sul; inclusive quatro mulheres grávidas que morreram junto com seus bebês.
- Destinação irregular de recursos públicos para que laboratórios ligados às Forças Armadas produzissem cloroquina em escala industrial muito além das necessidades da população brasileira caso a droga fosse usada em suas destinações tradicionais.
- Apologia de droga – cloroquina e hidroxicloroquina – não integrante de receituário médico para os fins propagados; com o agravante de esse crime ter sido cometido por meio de veículos de comunicação pública (e, aqui, o círculo de tiros a esmo das garruchas despirocadas de Queiroga e Wajngarten se encontram).
Havia algum romantismo e, decerto, alguns valores nos preceitos que guiavam Virgolino Ferreira, o Lampião, e a sua Maria Bonita, na condução de seu bando contra as volantes da República Velha no sertão nordestino. Nada disso existe, agora, no cangaço farsesco e miliciano que os bolsonaristas Wajngarten e Queiroga encenam nos cerrados do Planalto Central.
Uma resposta
” …banditismo por pura maldade…”