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Procura-se um rascunho de Ulysses Guimarães

O general Carlos Tinoco, o brigadeiro Sócrates Monteiro e o almirante Mário César Flores formavam a trinca de ministros militares do então presidente Fernando Collor. Não havia, ainda, Ministério da Defesa. A pasta só seria criada pelo presidente Fernando Henrique Cardoso em 1995 e destinada a um civil. Em mãos civis se conservou até a presidente Dilma Rousseff. Deposta Dilma, na esteira do golpe de 2016, os militares passaram a ocupar o posto.

Em julho de 1992 o barco de Collor começara a fazer água depois de bater nos icebergs Pedro Collor e Eriberto França. A cassação do presidente ganhou tração nas conversas noturnas de Brasília. Um grupo de parlamentares da oposição – os senadores Mário Covas e Fernando Henrique Cardoso, os deputados José Genoíno e Aloízio Mercadante à frente – tentou marcar uma conversa sigilosa com Tinoco, Monteiro e Flores. Ulysses Guimarães, que se opunha fortemente ao impeachment por temer retrocessos na restauração democrática brasileira, recusou-se a ser integrado ao grupo.

– Podemos nos reunir, mas não falaremos de impeachment porque isso é assunto do Congresso. E não discutiremos as apurações da CPI porque isso, no futuro, será assunto da Justiça – respondeu Flores a Genoíno, falando pela trinca fardada.

Estava dada a senha para que evoluíssem, dentro do Parlamento e sob os parâmetros da Constituição de 1988 e da política, as negociações para o impeachment.

            Fevereiro de 1988. A Constituição brasileira pós-ditadura militar ainda não havia ido para o forno. A sociedade civil se sentia co-autora da maioria dos dispositivos constitucionais. Os movimentos sociais estavam integrados às sessões legislativas. O presidente José Sarney discordava dos rumos tomados pela Assembleia Nacional Constituinte e tentava, em vão, influir no Capítulo da Ordem Econômica. Tentava ser bem-sucedido, ao menos, na briga pela manutenção do mandato de cinco anos herdado dos governos ditatoriais.

Ministros militares de Sarney, Leônidas Pires Gonçalves, do Exército; Octávio Moreira Lima, da Aeronáutica e Henrique Sabóia, da Marinha, tentaram incursões malsucedidas no intuito de influir na redação final de determinados artigos constitucionais. Antonio Carlos Magalhães, ministro das Comunicações e cacique baiano, verbalizou ameaças de interferência do Palácio do Planalto na Constituinte e, até, a possibilidade de a Assembleia Nacional ser dissolvida e a missão de redigir a Constituição ser entregue a um grupo de “juristas palacianos”.

Ulysses Guimarães, presidente da Câmara dos Deputados e da Assembleia Nacional Constituinte, rechaçou de pronto os arreganhos intervencionistas e, chamando de “Três Patetas” os integrantes da Junta Militar que governou o Brasil de agosto a outubro de 1969. Patetas haviam sido o general Aurélio de Lira Tavares, o almirante Augusto Rademaker e o brigadeiro Márcio de Sousa Melo, que usurparam o poder do vice-presidente civil de Arthur da Costa e Silva, o ditador inabilitado por um derrame, e assumiram a caneta e as ganas presidenciais no auge da escalada autoritária no País. Patetas, nas entrelinhas do discurso de Ulysses, seriam os ministros fardados caso se arvorassem a atentar contra a renascente Democracia brasileira.

            Tanto na crise de 1992, quanto na de 1988, poderíamos ter experimentado um brutal recesso democrático. Assistiríamos à interrupção do processo de volta à normalidade institucional. A Política e os políticos ofereceram saídas negociadas para o Brasil. Ulysses Guimarães, corajosamente ativo em 1988 e firmemente estoico em 1992, personificava e simbolizava a força magnética da ação política a favor da Democracia e das instituições democráticas. Não há nenhum Ulysses, quiçá um rascunho dele, entre os apatetados protagonistas da cena política brasileira atual.

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