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PEC do “Semipresidencialismo” não pode tramitar: atual Congresso é ilegítimo para debatê-la

Hugo Motta, imberbe. Arthur Lira, barba grisalha: criador e criatura

Sem plebiscito que autorize o Parlamento a reabrir a discussão derrotada em 1963 e em 1993, a iniciativa de Luiz Carlos Hauly é lixo legislativo. Muitas mudanças antecedem “parlamentarismo” à brasileira

Por Luís Costa Pinto

Como ato inaugural da Sessão Legislativa de 2025, como a celebrar o início do biênio de Hugo Motta (PP-PB) na Presidência da Câmara dos Deputados, o veterano parlamentar Luiz Carlos Hauly (Podemos-PR) protocolou a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 02/2025. É a “PEC do Semipresidencialismo”, um texto eivado de pretensões ilegítimas, cortejado por nulidades constitucionais e pajeado por uma hora de aventureiros que orbita há muito o Legislativo e outras instituições da República à espreita de brechas por onde possam passar e se apegar a nacos de poder e do Tesouro da União à guisa de votos. Votos para um projeto de poder político, para uma assunção institucional dentro das normas, não os têm. 

Semipresidencialismo é tese golpista de quem se acha esperto num universo de tolos. Esgrimir a volta do debate em torno de um Parlamentarismo brasileiro rebarbando o plebiscito que autorize a discussão do tema, ou prescindindo do referendo que torne legítima a troca de sistema de governo, é golpe. O que almeja Hauly, sob o olhar complacente e a caneta anuente de Motta, é dar um golpe por meio do qual um Congresso sem nenhuma delegação constituinte – para não falar da ausência de repertório biográfico de seus integrantes – tenta impor um cavalo-de-pau em nosso processo político e em nossa História e cassar a sacralidade e a força do voto popular na escolha de nossos governantes.

Os Constituintes de 1987-88, eleitos para reescreverem o Contrato Social bresileiro no fim da ditadura militar, produziram uma Constituição tão perfeita que nos deu caminhos naturais para mitigar suas próprias imperfeições. No capítulo das disposições transitórias da Carta de 1988 estava previsto que “cinco anos de promulgada a Constituição”, faríamos um plebiscito para ouvir da totalidade dos eleitores brasileiros o veredito: seríamos uma República presidencialista ou parlamentarista? Em 21 de abril de 1993, 55,67% dos brasileiros aptos a votar naquele momento optaram pelo presidencialismo. Escassos 24% preferiram o parlamentarismo. Jogo jogado, vox populi, vox Dei. Os derrotados na tese, como eu, aliás, recolheram os flaps e foram tocar a vida sob o regime presidencialista, que já havia sido o preferido da maioria também em 6 de janeiro de 1963, quando se revogou a engenhoca inconstitucional urdida pelos militares para tosar poderes do presidente João Goulart. 

A partir do pronunciamento arrasadoramente majoritário da população, quaisquer discussões sobre a mudança de regime de governo têm de ser antecedidas por um plebiscito que autorize a reabertura do tema. Se querem retomar o assunto, por que não colocá-lo em pauta nas urnas de 2026 (porque daí ele será abordado nos palanques de campanha de candidatos a presidente, aos governos estaduais, à Câmara, ao Senado, às Assembleias) e associar a eleição geral a um plebiscito que dê poderes ao futuro Congresso a discutir o assunto? Isso por que:

  1. Como falar em Parlamentarismo ou Semipresidencialismo sem que se alterem as regras de funcionamento dos partidos políticos? Sem pôr fim ao caudilhismo que grassa nas instituições partidárias? Sem oxigenar internamente as legendas que, hoje, servem à estruturação de verdadeiras empresas familiares com faturamento certo (o Fundo Partidário e o Fundo Eleitoral) egresso do erário público e com fiscalização claudicante?
  2. Como falar em Parlamentarismo ou Semipresidencialismo sem reinstituir a fidelidade partidária e a reinstituição da força institucional dos líderes partidários por sobre as bancadas, sem que se submetam a vontades dos presidentes ou dos chefetes das siglas?
  3. Como falar em Parlamentarismo ou Semipresidencialismo sem adotar o voto distrital – de preferência, o distrital puro?
  4. Como falar em Parlamentarismo ou Semipresidencialismo sem redistribuir o tamanho das bancadas estaduais de forma correta, sem aumentar cadeiras na Câmara, mas, reduzindo as bancadas dos estados que perderam população ou daqueles que estão sobrerepresentados? As distorções da representação política precisam ser sanadas para que o debate corra de forma hígida e séria.
  5. Como falar em Parlamentarismo ou Semipresidencialismo sem promover um novo Pacto Federativo, redistribuindo compromissos e deveres dos entes federados? 
  6. Como falar em Parlamentarismo ou Semipresidencialismo sem que proíba terminantemente que um político eleito para o Congresso – deputado ou Senador – ou para as Assembleias Legislativas ou Câmara Distrital, vire ministro ou secretário de estado? Política se faz com consciência do seu lugar na sociedade. Se foi eleito para o Legislativo, como representante direto de seu povo, que fiques na Casa determinada. Se queres virar linha auxiliar do Executivo, renuncies ao voto recebido. É assim nos Estados Unidos, até há alguns anos “a maior Democracia do Ocidente”. É assim que tem de ser.

O Brasil não está maduro para rediscutir sistemas de Governo e nem há legitimidade nesse Congresso para pôr o tema em debate. A PEC 02/2025 não deve entrar em tramitação e o presidente da Câmara que chegou ao posto em razão da extensa ficha de serviços prestados aos dois mais deletérios personagens que sentaram naquela cadeira, Eduardo Cunha e Arthur Lira, mostrará se tem grandeza ou pequenez a partir da decisão que tomar quando a iniciativa ladina de Hauly chegar às suas mãos.  

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